Música, vídeos e até horóscopos gastam créditos dos pré-pagos. Clientes muitas vezes não percebem compra
RIO
- Provavelmente você nunca ouviu falar em serviço de valor agregado à
telefonia, SVA para os entendidos em telecomunicações. Mas já deve ter
recebido oferta e, quem sabe até contratado, pelo seu smartphone,
streaming de música e de vídeos, boletins de notícia, resultados de
jogos, horóscopo e, quem sabe, um curso de idioma. Até aplicativos
populares, como é o WhatsApp hoje e como foi o SMS — que um dia foi o
carro-chefe do segmento — é considerado um SVA pelas operadoras. O fato é
que esses serviços já representam cerca de 50% da receita das empresas
de telefonia e, segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel),
uma das grandes fontes de problemas para os consumidores, especialmente
na modalidade pré-paga.
Os usuários, dizem os especialistas, dividem-se
em dois grandes grupos: os que não sabem sequer que contrataram o
serviço e aqueles que o fizeram conscientemente, mas sem saber qual
seria impacto em seu pacote de dados.
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Desde 2010, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) acompanha a evolução desses serviços. As operadoras de telefonia ocupam as primeiras posições no ranking de reclamação do Sindec (que reúne queixas dos Procons do país). Apesar de não ser possível precisar o percentual de queixas específico sobre os serviços de valor agregado, André Luiz Lopes Santos, diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), do Ministério da Justiça, diz não ter dúvida de que esse percentual é crescente.
— O modelo de tabulação do Sindec é
antigo, e não há como capturar esse dado. Mas, olhando pontualmente os
casos, vemos com frequência queixas relacionadas ao tema. Já chamamos
todas as empresas ao DPDC para esclarecer questões relacionados à
oferta, à contratação. Por enquanto, não há nenhum processo de sanção —
diz o diretor do DPDC.
MUDANÇAS URGENTES PARA REGULAR SERVIÇOS
Santos
diz que a Anatel também está sendo convidada ao debate. Ele avalia que
serão necessárias mudanças na regulação, inclusive na Lei de Geral de
Telecomunicações, para garantir mais proteção ao consumidor:
—
Esses serviços não são considerados de telecomunicações, embora dependam
dessa infraestrutura para subsistir e representem uma parte
significativa da receita das empresas. Não sou a favor de regular tudo,
mas é preciso haver parâmetros mínimos, que garantam mais do que
informação e comunicação. Hoje, esses serviços estão em um limbo.
Pesquisador
em Telecomunicações do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
(Idec), Rafael Zanatta lembra que a questão era prioritária para o grupo
de trabalho do setor da Senacon, formado em dezembro do ano passado,
mas que, quando surgiu a polêmica sobre cobrar franquias para uso de
dados na telefonia fixa, os SVAs ficaram em segundo plano:
— É um
universo gigantesco. Não tem categorização, nem regulação. Chegou-se a
registrar mais de 80 tipos de serviços adicionados, além de um aumento
significativo das queixas referentes a essas cobranças. As empresas têm
conhecimento, mas fazem vista grossa, muitas vezes jogando a culpa para
outra cadeia de atores do sistema, como quem trabalha com venda de
chips, que acabam embutindo os SVAs no pacote. Por isso, defendo uma
regulação urgente, para desestimular a oferta dos serviços adicionais.
A
agência reguladora afirma que já vem atuando para coibir essas
cobranças tanto por meio de fiscalizações como por processos de
acompanhamento e controle. O órgão acrescenta que o Regulamento Geral do
Consumidor dos Serviços de Telecomunicações (RGC) só permite a cobrança
dos SVAs nos casos em que há prévia e expressa autorização do
consumidor. Além disso, a prestadora deve fornecer ao consumidor, em sua
página na internet, o detalhamento dos valores desses serviços, quando
cobrados.
Mas, normalmente, não é isso que acontece. Desde que
passou sua linha telefônica para pré-paga, Márcio Dias de Carvalho
observou que os créditos terminavam muito antes do que deveriam. Porém,
não conseguia acessar o extrato de ligações. Quando conseguiu o extrato
em junho, verificou que havia uma cobrança de R$ 12,90 pelo SPDA Vivo
Música, serviço que não contratou e sequer utilizou.
— É muito difícil visualizar essas cobranças, até mesmo no site da operadora. Além disso, as cobranças eram intermitentes, vinham em um mês, no outro não. E acabavam com meus créditos — conta Carvalho, que tentou resolver o problema diretamente com a Vivo, pelos canais convencionais, mas só obteve resultado ao enviar carta para a Defesa do Consumidor do GLOBO. — Eles me cobravam desde setembro de 2015. Pelo menos, estornaram o valor total, de cerca de R$ 150, em novos créditos.
A Vivo confirma que
a situação do cliente se encontra regularizada, mas que lhe foram
enviados SMSs com dados sobre tarifação do serviço, preço tarifado e
opção de cancelamento do serviço.
No caso da auxiliar de
informática Jacilene Adriano, a cobrança começou em abril do ano
passado, mas só foi percebida em janeiro deste ano, quando os créditos
começaram a “sumir” sem que fossem feitas ligações.
— O telefone é
da minha mãe, de 83 anos, que só recebe e faz ligações. Mas percebemos
que estavam sendo cobrados nove serviços extras na linha — conta a
auxiliar de informática, que chegou a colocar R$ 50 em créditos para
fazer um teste — em poucos minutos, cerca de R$ 30 desapareceram.
Segundo
Jacilene, a empresa alegou que, para a cobrança ser autorizada, era
preciso o cliente enviar um SMS, algo impensável para sua mãe, que, além
de idade avançada e falta de conhecimento, apresenta comprometimentos
decorrentes de um AVC. Depois da reclamação ao GLOBO, a Claro devolveu
R$ 500 em créditos para serem usados em um ano. A empresa confirma ter
efetuado os ajustes devidos.
Coordenadora do Núcleo de Defesa do
Consumidor (Nudecon) da Defensoria Pública do Estado do Rio, Patrícia
Cardoso reforça o fato de os mais prejudicados nesse segmento serem os
usuários de planos pré-pagos, que são, justamente, aqueles com menor
renda e menor nível de informação:
— Quando se tem a conta
pós-paga, é mais fácil verificar a cobrança indevida e até reclamar com a
operadora. No caso do celular pré-pago, as pessoas não entendem o
motivo de seus créditos estarem sendo reduzidos tão rapidamente. O fato é
que o serviço de telefonia é muito complexo e se universalizou, com um
grande percentual de usuários de dados, mas o nível de informação
continua muito pequeno.
PRAZO DE TRÊS ANOS PARA CONTESTAR COBRANÇA
Independentemente
de haver regulamentação específica para esses serviços, aplica-se o
Código de Defesa do Consumidor, diz a coordenadora do Nudecon,
destacando que as reclamações nos órgãos de defesa do consumidor não
correspondem ao tamanho do problema.
— Até porque, como algumas
vezes são valores baixos e as pessoas sequer sabem o que está
acontecendo na sua conta, não há número de queixas considerável —
ressalta Patrícia.
A Anatel informa que o consumidor tem o prazo
de até três anos para contestar a cobrança e que tem direito de receber
em dobro os valores pagos indevidamente. Caso opte por receber o
ressarcimento em créditos, estes poderão ser utilizados tanto para o
consumo em serviços de telecomunicações quanto em adicionados.
No caso da Telefônica Vivo, dados e SVA respondem por 46% dos negócios, com receita de R$ 2,6 bilhões, e está em crescimento. No segundo trimestre deste ano, em relação ao mesmo período de 2015, a alta foi de 24%. A empresa informa que oferece aos seus clientes cerca de 80 serviços digitais e, para contratá-los, o cliente deverá utilizar o sistema de dupla confirmação de compra.
Na TIM, a receita líquida
de serviços de valor agregado cresceu 10,5% no segundo trimestre,
chegando a R$ 1,5 bilhão — cerca de 45% da receita de serviços móveis.
Segundo a operadora, embora o SMS tenha caído 35%, os serviços chamados
inovativos (como música, por exemplo) subiram 19%. A operadora diz ter
um projeto em andamento que integrará os SVAs em uma plataforma única,
facilitando a gestão do que é contratado pelos clientes, incluindo
ativação, cancelamento e tarifação.
Claro e Oi não detalham em
seus resultados financeiros o peso do SVA na receita. A Claro informa
que implementou novas ações de SVA, que incluem padronização das
comunicações de vendas e melhoria no canal de contratação, incluindo
mais etapas de confirmação da assinatura por parte dos clientes. Já a Oi
esclarece que só disponibiliza SVA mediante contratação dos clientes e
que os serviços podem ser cancelados a qualquer momento.
Leia
mais sobre esse assunto em
http://oglobo.globo.com/economia/servicos-no-celular-geram-cobranca-indevida-20340388#ixzz4O0JTjj9c
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Fonte: O Globo
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