Aspectos polêmicos da nova lei do aviso prévio

Em 13 de outubro de 2011, quando da sua publicação no Diário Oficial da União, entrou em vigor a Lei nº 12.506, de 11 de outubro de 2011, que regulamentou o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço previsto no inciso XXI, do art. 7º, da Constituição Federal (CF).

De acordo com a nova lei, o prazo do aviso prévio de que trata o Capítulo VI do Título IV da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), será de 30 (trinta) dias para os empregados que possuem até um ano de trabalho na mesma empresa (art. 1º).

A esse prazo, serão acrescidos 3 (três) dias para cada ano de serviço prestado na mesma empresa, até o limite máximo de 60 (sessenta) dias (§ único do art. 1º). Isso significa que o prazo máximo do aviso prévio poderá ser de 90 (noventa) dias (30 + 60). Antes da nova lei, o aviso prévio era de trinta dias, que era o prazo mínimo estabelecido na Constituição Federal (art. 7º, XXI).

Com a publicação da Lei nº 12.506/2011, já surgiu polêmica sobre a aplicação retroativa da lei para as rescisões contratuais ocorridas nos últimos dois anos. Para as centrais sindicais a nova regra do aviso prévio deve ser aplicada para os casos anteriores à lei, o que vai de encontro ao art. 5º, inciso XXXVI, da CF, que consagra o princípio da irretroatividade da lei, isto é, a lei só produz efeitos para o tempo futuro, salvo em se tratando de matéria penal, em que a lei pode retroagir seus efeitos para beneficiar o réu, já condenado ou em via de sê-lo.

Assim, muito embora o art. 7º, inciso XXI, da Constituição Federal já assegurasse aos trabalhadores o "aviso prévio proporcional ao tempo de serviço", sendo no mínimo de trinta dias, é certo que a proporcionalidade do aviso prévio, com base no tempo de serviço, por se tratar de norma de eficácia contida, dependia de legislação regulamentadora.

Como o direito brasileiro no art. 5º, XXXVI, da CF e no art. 6º, §§ 1º e 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil (LICC) prescreveu que a lei em vigor tem efeito imediato e geral, respeitado sempre o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, tem-se que a nova regra do aviso prévio proporcional ao tempo de serviço se aplica apenas aos casos presentes e futuros.

A nova lei não pode retroagir para incidir sobre fatos e situações jurídicas consumadas antes da sua entrada em vigência, sob pena de desrespeitar o ato jurídico perfeito. Nessa situação se inclui os trabalhadores que já cumpriram integralmente o aviso prévio de 30 (trinta) dias, até o dia 12 de outubro de 2011, por configurar o ato jurídico perfeito a que alude o art. 6º, § 1º, da LICC: “Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou”.

Entretanto, como a nova lei não trouxe disposições transitórias para regrar o chamado direito intertemporal com o objetivo de resolver e evitar conflitos que emergem da nova regra do aviso prévio proporcional ao tempo de serviço com aquela definida anteriormente, surge a dúvida sobre qual regra aplicar aos trabalhadores que estavam cumprindo o aviso prévio na data em que a Lei nº 12.506 entrou em vigor.

Muitos têm entendido que a nova regra do aviso prévio proporcional ao tempo de serviço se aplica apenas as demissões ocorridas a partir do dia 13 de outubro de 2011, dia em que a Lei nº 12.506/2011 entrou em vigor.

Mas o Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ministro João Oreste Dalazen, em entrevista ao G1, na sexta-feira (14) ressaltou que a omissão da nova lei cria dúvida em relação a qual regime de regras deve prevalecer no caso (disponível em: http://eptv.globo.com - acesso em 15/10/2011).

Nosso entendimento é no sentido de que a nova lei se aplica aos trabalhadores que estavam cumprindo o aviso prévio no dia em que a nova regra entrou em vigor, porque de acordo com o art. 489 da CLT a rescisão contratual somente se torna efetiva depois de expirado o prazo do aviso prévio, sendo que o § 6º do art. 487 da CLT estabelece que o período do aviso prévio, trabalhado ou indenizado, integra o tempo de serviço do empregado para todos os efeitos legais.

Logo, a concessão de aviso prévio, ainda que indenizado, por não colocar fim ao contrato de trabalho de imediato, beneficia o empregado não só com vantagens econômicas obtidas no período de pré-aviso, ou seja, salários, reflexos e verbas rescisórias (Súmula 371 do TST), como também a inclusão do prazo do aviso prévio na contagem do tempo de serviço e a anotação da data da baixa na Carteira de Trabalho correspondente ao término do prazo do aviso prévio, mesmo o indenizado (OJ-DI nº 82 do TST).

Além disso, no caso de concessão de auxílio-doença no curso do aviso prévio, os efeitos da dispensa só se concretizam depois de expirado o benefício previdenciário (Súmula 371 do TST); e o empregado que, durante o prazo do aviso prévio, cometer qualquer das faltas consideradas pela lei como justas para a rescisão, perde o direito ao restante do respectivo prazo (art. 491 da CLT).

Portanto, o simples fato de a comunicado da dispensa ter ocorrido antes da publicação da nova lei, não é suficiente para afastar a aplicação do aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, pois o ato jurídico não se consumou sob a égide da regra antes vigente.

Invocamos, outrossim, em reforço a esse entendimento, a aplicação analógica do art. 2028 do atual Código Civil de 2002 que, com o objetivo de resguardar as situações de direito intertemporal consolidado, dispôs que : “Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais de metade do tempo estabelecido na lei revogada”.

Dessa forma, só seria aplicável o prazo da lei anterior se fosse reduzido pela nova lei e se houvesse transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei anterior. Como a Lei nº 12.506/2011 aumentou o prazo do aviso prévio, aplica-se a regra estabelecida no novo diploma legal.

Outra polêmica que se estabeleceu com a nova lei foi se o tempo adicional de aviso prévio se aplica também ao pedido de demissão feito pelo empregado. Segundo o Relator do projeto que deu origem a Lei nº 12.506/2011, Deputado Arnaldo Faria de Sá, o direito a um aviso prévio maior que os 30 (trinta) dias atuais só existe para o empregado demitido sem justa causa, e não para o empregador, conforme notícia veiculada no site da Câmara na Internet (disponível em : www.camara.gov.br – data do acesso em 14/10/2011).

O aviso prévio consiste em uma obrigação entre as partes do contrato de trabalho por prazo indeterminado, no sentido de notificar uma à outra a sua intenção de pôr fim ao vínculo empregatício.

Apesar de o art. 1º da Lei nº 12.506/2011 prescrever que o aviso prévio “na proporção de 30 (trinta) dias” ser um direito a ser concedido “aos empregados que contem até 1 (um) ano de serviço na mesma empresa”, não se pode olvidar que o aviso prévio tem uma função recíproca: tanto tem direito o empregado de receber o aviso prévio em caso de denúncia do contrato de trabalho por prazo indeterminado por parte do empregador como este tem o direito de o receber do empregado, quando a denúncia partir deste último. O § 2º do art. 487 da CLT dispõe que o empregado também tem obrigação de dar aviso prévio.

A finalidade do aviso prévio é dupla. Para o empregado evita o rompimento brusco do contrato de trabalho por prazo indeterminado, permitindo-lhe tempo para procurar um novo emprego; para o empregador, a busca de outro trabalhador no mercado de trabalho que substitua o demissionário.

Assim, como para o trabalhador a despedida abrupta causa um impacto na sua vida familiar e social, também para a empresa, a saída repentina de um empregado com larga experiência e muitos anos de trabalho, no qual foi feito investimento em preparação e qualificação profissional, é um prejuízo que pode não ser facilmente recuperável, daí porque o disposto nos §§ 1º e 2º, do art. 487, da CLT estabelece o pagamento de indenização para aquele que não cumpre o prazo do aviso prévio.

Ora, se a Lei nº 12.506/2011 dispôs sobre o aviso prévio de que trata o Capítulo VI do Titulo IV da CLT, e se a Consolidação das Leis do Trabalho cuida do aviso prévio, tanto aquele concedido ao empregado, quanto aquele dado ao empregador, com conteúdo de igualdade (prazo igual para ambas as partes) e de reciprocidade de tratamento (o aviso prévio é ao mesmo tempo uma obrigação e um direito de ambas as partes de um contrato de trabalho indeterminado), pode-se afirmar que o novo prazo do aviso prévio proporcional ao tempo de serviço também se aplica aos casos de demissão por iniciativa dos trabalhadores.

Outras dúvidas sobre a aplicação do novo prazo do aviso prévio que precisam ser esclarecidas são : a) a partir de quando começa a contagem do prazo adicional de três dias para cada ano trabalhado; se logo após o empregado completar o primeiro ano de serviço na mesma empresa ou somente a partir do segundo ano, quando este completar o ano adicional; b) proporcionalidade do aviso prévio adicional; c) redução da jornada durante o cumprimento do aviso prévio; dentre outras.

Nossa opinião é de que o acréscimo de 3 (três) dias no aviso prévio de 30 (trinta) dias se aplica imediatamente após o empregado completar um ano de serviço, porque o § único do art. 1º da Lei nº 12.506/2011 não determina que o acréscimo seja computado apenas a partir do 2º ano de trabalho.

Em relação a proporcionalidade do acréscimo do aviso prévio, alguns opinam que a fração igual ou superior a seis meses deve ser havida como um ano integral para os efeitos do cálculo do tempo adicional de aviso prévio, aplicando-se analogicamente a regra da gratificação de natal.

Por exemplo, se o empregado é dispensado sem justa causa, com 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de serviços na mesma empresa, o seu aviso prévio deve ser de 45 (quarenta e cinco) dias (equivalente ao de alguém com 5 (cinco) anos de serviço).

Nossa sugestão é no sentido de que a proporcionalidade seja calculada quadrimestralmente, porque o acréscimo do aviso prévio é de 3 (três) dias por ano de serviço, sendo que o ano completo tem 12 (doze) meses; logo, a cada quatro meses, o empregado adquire o direito a um dia de aviso prévio adicional. No exemplo acima citado, o empregado teria direito a 44 (quarenta e quatro) dias de aviso prévio (30 dias + 14).

De outra parte, a nova lei é omissa em relação ao número de dias que o empregado pode faltar ao serviço, sem prejuízo do salário integral, no curso do aviso prévio trabalhado, quando este for superior a 30 (trinta) dias. De acordo com a redação atual do art. 488 caput e parágrafo único da CLT, o empregado pode optar entre a redução da jornada de trabalho em duas horas diárias, sem prejuízo do salário (caput), e 7 (sete) dias corridos (parágrafo único).

Contudo, as faltas ao serviço por sete dias corridos, sem prejuízo do salário integral, se referem apenas ao aviso prévio com duração de 30 (trinta) dias, porque o parágrafo único do art. 488 da CLT remete ao inciso II do art. 487 da CLT, que trata do aviso prévio de 30 (trinta) dias.

Daí porque, a nossa sugestão é aplicar uma regra de três para se chegar ao número de dias que o empregado poderá se ausentar do serviço, sem prejuízo do salário, no curso do aviso prévio trabalhado. Por exemplo: o empregado que tem três anos de serviço, se demitido sem justa causa, terá direito a 39 (trinta e nove) dias de aviso prévio, podendo faltar ao serviço sem prejuízo do salário, por 9,1 dias ou 10 (dez) dias se as frações de unidade derem lugar a um dia.

30 dias...........7 dias
39 dias...........x dias
x = 273 = 9,1
30

Enfim, caberá a Justiça do Trabalho, ao julgar os conflitos trabalhistas que decorrerem da aplicação da nova lei, esclarecer os pontos omissos, ou, antes disso, as partes negociarem, por meio de instrumento coletivo, o regramento dessas omissões.

Fonte: Última Instância, por Aparecida Tokumi Hashimoto (Advogada sócia do escritório Granadeiro Guimarães Advogados ), 17.10.2011

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