A
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que a
Justiça Federal na Paraíba reexamine o caso de um cidadão cuja dívida
com a Caixa Econômica Federal (CEF) passou de um valor equivalente a R$
6,6 mil em 1993 para R$ 1,225 bilhão em 2007. Ao anular a sentença que
havia mantido a execução da CEF contra o consumidor, pessoa física, os
ministros ordenaram o retorno do processo à primeira instância, para
análise de possíveis abusos nas cláusulas do contrato de mútuo e
eventual realização de perícia contábil.
Segundo o
relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, o valor original da
dívida - correspondente na época ao preço de um carro popular -
alcançou, em 14 anos, o equivalente ao preço de 55.180 carros populares.
Para ele, em vez de rejeitar os embargos à execução opostos pelo
devedor, o juízo de primeira instância "deveria ter revisado o contrato
de adesão", para apurar eventual abuso nos encargos, conforme previsto
pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O
devedor alega que, após a assinatura do contrato, em novembro de 1993, a
CEF teria engendrado uma equação matemática unilateral e imprecisa,
para chegar ao valor de mais de R$ 1,225 bilhão em 2007. O Tribunal
Regional Federal da 5ª Região (TRF5) confirmou a sentença que julgara
improcedentes os embargos à execução, afirmando que caberia ao devedor
ter contestado a veracidade das informações prestadas pela contadoria
judicial, segundo as quais o valor cobrado pela CEF seria adequado às
disposições do contrato.
CDC
A
defesa do executado alegou em recurso ao STJ que seria possível a
incidência do Código de Defesa do Consumidor e, consequentemente, a
revisão judicial do contrato. O feito relativo aos embargos está
sobrestado no TRF desde novembro de 2009, e o processo executivo foi
arquivado em abril de 2012, por não haver bens para penhora, podendo ser
reativado se tais bens forem localizados.
De
acordo com o relator, "é pacífica a submissão dos contratos bancários às
regras do CDC". Ele acrescentou que a Segunda Seção do STJ firmou em
recurso repetitivo o entendimento de que "é admitida a revisão das taxas
de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que
caracterizada a relação de consumo e que a abusividade fique cabalmente
demonstrada ante as peculiaridades do julgamento em concreto".
A
Quarta Turma entendeu ainda que é possível o questionamento das
cláusulas contratuais de mútuo em embargos do devedor, tanto quanto em
ação revisional, porque ambas têm o caráter de demanda cognitiva
prejudicial à execução. Além disso, segundo o ministro Salomão, os
embargos veiculam matéria ampla de defesa - pois visam discutir a
própria formação do título executivo - e excesso de execução, o que, se
acolhido, acarretará a redução do débito.
Embora
seja vedado ao juiz apreciar de ofício (sem provocação da parte) o
caráter abusivo de cláusulas bancárias, Salomão observou que, no caso
julgado, o devedor tentou caracterizar essa abusividade ao apontar
excesso de execução, principalmente por causa da suposta ilegalidade dos
índices de juros e correção monetária, da comissão de permanência, do
IOF e dos juros moratórios.
Perícia rejeitada
Em
seu voto, Luis Felipe Salomão destacou que o devedor havia requerido a
produção de prova pericial, mas a CEF se manifestou contrária, ao
argumento de que a planilha apresentada teria seguido rigorosamente as
cláusulas do contrato. A perícia foi indeferida pelo juiz.
"Por
reiteradas vezes, a contadoria judicial solicitou ao juízo fosse
oficiada a CEF para esclarecer sobre a memória de cálculos apresentada,
denotando, assim, não só a complexidade das contas, como também a
absoluta falta de clareza na sua elaboração", relatou o ministro. Ele
comentou que os cálculos da contadoria foram de fato realizados com
observância das cláusulas contratuais, "especialmente aquelas
manifestamente abusivas".
O relator apontou que a
mesma dívida, em 2001, a partir das mesmas taxas de juros informadas
pela CEF (37,92% a 47,01% ao mês), foi calculada em dois valores
diferentes: R$ 111,9 mil e R$ 8,8 milhões. O último valor prevaleceu na
execução. REsp 1148247
Fonte: Superior Tribunal de Justiça
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