Os números de linhas de telefones móveis
se multiplicam no Brasil a cada ano. O primeiro mês de 2014 contabilizou
272,4 milhões de celulares, atingindo cerca de 136 linhas por 100
habitantes – mais chips ativados do que brasileiros. Isso não significa,
porém, que todo o brasileiro possua uma linha de telefonia móvel.
Pesquisa realizada entre o final de 2012 e início de 2013 pelo Centro de
Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (CETIC),
ligado à entidade que administra o nome de domínio .br no Brasil, o
NIC.br, constatou que 20% das pessoas entrevistadas não possuíam
telefone celular. Essa proporção aumentava quando considerados os
entrevistados da área rural e das classes D e E, chegando a 40%.
Por outro lado, não é incomum que as pessoas tenham chips de diferentes
operadoras, considerando também os altos preços das chamadas de uma
operadora para a outra em razão da historicamente elevada tarifa de
interconexão (valor que uma operadora paga para que sua ligação seja
encaminhada na rede de outra companhia móvel). Outro traço relevante
dessa estatística é o fato de aproximadamente 78% dessas linhas serem
pré-pagas. Apesar de ter sido essa modalidade de serviço a responsável
por intensificar a penetração do celular, algumas de suas
características a tornam mais precária em relação ao pós-pago,
prejudicando os vários consumidores de baixa renda.
A primeira delas é o preço das ligações, em geral consideravelmente
mais caro do que o praticado nos planos pós-pagos. Quando há promoções
interessantes que poderiam beneficiar o consumidor, não raramente elas
vêm acompanhadas de publicidade enganosa e condições complicadas as
quais se dá pouco destaque na oferta. Aliás, conhecer adequadamente as
condições do serviço contratado é outro dos desafios nos planos móveis
pré-pagos. A facilidade de acesso a esses chips no Brasil, que podem ser
adquiridos em estações de metrô, bancas de jornal e outros variados
tipos de revendedores, se é bom por um lado, por outro exige uma
dinâmica mais cuidadosa para que os consumidores consigam saber o que
estão contratando.
Boa parte das principais operadoras móveis do país fornecem no pacote
junto ao chip o contrato de adesão do serviço de telefonia móvel. Assim,
independentemente de onde o chip seja comprado, ele virá acompanhado
desse documento. Contudo, nenhuma delas apresenta as condições
específicas do plano, tais como o preço das chamadas à mesma operadora e
a outras companhias, o valor para ligações a telefones fixos, o preço
das mensagens de texto, as condições de roaming e ligações de longa
distância, eventual acesso à Internet incluído, entre outros. Nas
empresas que oferecem mais de um plano pré-pago, não há sequer um
momento em que o consumidor, ciente das condições de cada plano, opta
pelo que melhor lhe convém.
Uma terceira questão é o fato de os créditos possuírem prazo de
validade, isto é, expirarem após um período ainda que o consumidor não
os tenha utilizado. Pela regulação brasileira, caso o usuário faça uma
nova recarga, os créditos expirados voltam a valer pelo mesmo prazo dos
novos créditos. Porém, caso ele não recarregue novamente depois de a
validade do crédito expirar, em 30 dias a operadora pode suspender
totalmente o serviço (mesmo com créditos retidos, o usuário não pode
receber chamadas) e em 60 dias a empresa está autorizada a cancelar o
serviço sem ter a obrigação de devolver os créditos pagos e não
utilizados pelo consumidor.
Ainda segundo a regulação atualmente em vigor, as empresas podem
oferecer créditos com qualquer validade (1 dia, 5 dias, 10 dias, 30
dias...) desde que disponibilizem ao menos em suas lojas próprias
créditos com prazo igual ou superior a 90 e 180 dias. A diferença de
preços entre os créditos é liberalidade da operadora; a regulação se
refere somente a “valores razoáveis”. Esses e outros pontos são
discutidos em mais detalhes em pesquisa que o Idec (Instituto Brasileiro
de Defesa do Consumidor) realizou para o Dia Mundial do Consumidor .
Recentemente a agência reguladora das telecomunicações no Brasil, a
Anatel, aprovou um novo regulamento unificado para os direitos dos
consumidores nesses serviços, incluindo telefone fixo, Internet, TV por
assinatura e telefone móvel. No que se refere aos planos pré-pagos, a
agência determinou que a validade mínima dos créditos deverá ser de 30
dias, mantendo a oferta obrigatória de créditos com prazo igual ou
superior a 90 e 180 dias. Embora seja complicada a existência de
validade para os créditos, essa determinação avança em relação ao
cenário anterior por colocar fim aos créditos mais baratos com validade
muito reduzida. Já com relação aos créditos obrigatórios mais extensos, é
ruim que a obrigação de ofertá-los continue se reduzindo às lojas
próprias das operadoras. Sua oferta deveria ser exigida também através
dos meios remotos de recarga, como pela Internet ou pelo telefone.
O novo regulamento não foi publicado oficialmente até o momento, mas já
é possível identificar novidades importantes a partir das informações
divulgadas pela agência. Uma das regras mais interessantes é a
possibilidade de o consumidor cancelar automaticamente o seu serviço,
sem a necessidade de falar com um vendedor ou atendente da empresa. Ele
pode fazê-lo pela Internet ou pela central de atendimento telefônico
interagindo diretamente com o sistema da empresa, sem o contato com um
atendente. Evita-se, com isso, a prática da retenção e os variados
expedientes para dificultar o cancelamento do serviço. Outra medida,
relacionada aos problemas aqui apontados, trata da obrigação de a
operadora apresentar ao consumidor um sumário com as informações sobre a
oferta antes da formalização da contratação de qualquer serviço. A
maior parte das novas regras passa a valer depois de 120 dias da
publicação do regulamento.
Assim, é sempre importante frisar que o aumento de acessos nos serviços
de telecomunicações não é, em si, um dado a ser comemorado. A
penetração dos serviços deve ser diretamente acompanhada de
investimentos para garantir a sua qualidade, no atendimento e na
capacidade de rede. Deve ser acompanhada também pela atenta e rotineira
atuação das autoridades públicas, para dar efetividade às regras
positivas já existentes e promover o contínuo aprimoramento da regulação
visando à proteção dos direitos do consumidor e do cidadão. Ainda temos
muitos desafios pela frente, sendo a mobilização global por esses
direitos, certamente, um elemento fundamental para superá-los.
Fonte: http://www.idec.org.br/em-acao/artigo/mais-celulares-mas-quantos-direitos
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