Tribunais interpretam STF e União paga por terceirizadas

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) sinalizou no início do ano que deve mudar sua Súmula 331, sobre terceirização, após o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir, no final do ano passado, que a União não responde por dívidas trabalhistas de empresas terceirizadas.

Enquanto a alteração não vem, a Justiça do Trabalho está interpretando a decisão do Supremo em conjunto com a súmula e entendendo que deve haver mais rigor ao investigar se a inadimplência trabalhista decorre de falha ou falta de fiscalização do poder público contratante.

A Justiça do Trabalho vem levando em conta que o STF disse não ser automática a responsabilização da União, ou seja, cada caso tem que ser analisado para ficar demonstrada a culpa e não pode haver presunção ou generalização, e sim, cautela - o que em muitos casos já ocorria. Em outros, a Justiça do Trabalho reconhecia que cabia à administração pública responder automaticamente, após o não pagamento pela prestadora de serviços.

Recentemente, a Vara do Trabalho de Ponte Nova, em Viçosa, Minas Gerais, recebeu várias reclamações trabalhistas envolvendo a Universidade Federal de Viçosa, ajuizadas por empregados terceirizados de uma empresa prestadora de serviços de conservação e limpeza.

Em um caso, a juíza substituta Rosângela Paiva entendeu que os órgãos públicos não estão isentos de responsabilidade pelo simples fato de a empresa contratada ter participado do processo de licitação.

A magistrada condenou a empregadora a pagar as verbas rescisórias devidas e R$ 10 mil de indenização por danos morais (a empresa tinha conhecimento da senha dos empregados e teria ocorrido violação do sigilo e da privacidade do autor da ação). De acordo com a decisão, em caso de descumprimento da obrigação pela devedora principal, a dívida trabalhista deverá ser paga pela universidade.

A juíza afirmou que, ao contratar uma empresa prestadora de serviços, a contratante tem o dever de fiscalizar a idoneidade financeira da contratada, já que a tomadora de serviços é a beneficiária direta da força de trabalho terceirizada. Assim, a administração pública não está isenta da obrigação de fiscalizar a empresa contratada. No caso, a juíza considerou que houve culpa da universidade, que foi conivente e omissa com a situação irregular de sua prestadora de serviços.

Na prática, esse tipo de decisão deve continuar - ao contrário dos que achavam que o poder público escaparia dos pagamentos e o trabalhador ficaria desamparado - e não contraria a decisão do Supremo.

A Corte declarou constitucional o artigo 71, parágrafo 1º, da Lei 8.666, de 1993 (Lei de Licitações) ao analisar a ação declaratória de constitucionalidade (ADC 16), ajuizada pelo governo do Distrito Federal.

O dispositivo diz que a inadimplência de contratado pelo Poder Público em relação a encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento.

A Súmula 331 do TST diz exatamente o contrário e deve ser mesmo adequada em breve. O inciso IV diz que "o inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista".

O acórdão do Supremo, no entanto, ainda não foi publicado. E essa é uma das razões, além da troca na direção do Tribunal, pelas quais o TST ainda não alterou a redação de sua súmula, segundo o advogado Daniel Chiode, do Demarest e Almeida Advogados.

"Sem o acórdão, não é possível saber a extensão exata do que foi decidido. Com a publicação, será possível saber a exata autonomia que os juízes vão ter para identificar se houve fraude na terceirização", afirma.

Segundo o advogado, o Supremo, nas discussões do caso, abriu margem e espaço para que os tribunais e até mesmo o TST analisem cada caso para identificar se houve terceirização ilícita ou fraude.

"Permitir que o estado ficasse sem qualquer responsabilidade seria prejudicial para o trabalho. E como há terceirizações sérias, é correto também os juízes terem mais cautela para caracterizar culpa na escolha ou na fiscalização. Vai ficar um pouco mais difícil responsabilizar o estado."

O advogado Marcel Cordeiro, do Salusse Marangoni Advogados, afirma que a Lei de Licitações traz, no artigo 67, o dever de fiscalização do administrador público. "A Justiça do Trabalho vai continuar a analisar caso a caso para decidir se há responsabilidade subsidiária. Só não poderá haver presunção", destaca.

Fonte: Diário do Comércio, Industria e Serviços, por Andréia Henriques, 30.03.2011

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